Francisco Sotero dos Reis
As Academias necessitam de tempo à sua afirmação, assim entendia Joaquim Nabuco. Na verdade, porém, é um processo de acumulação através dos tempos; as academias que nascem, como a nossa Academia Maranhense de Cultura Jurídica, Social e Política, apropriam-se dessa cultura e, por obrigação, devem agregar-lhe valor.
É do meu primeiro livro “Fortes Laços” a crônica intitulada “Academia em dia de festa”, que faz referências a Platão, fundador, em 387 a.C., próxima a Atenas, de uma escola dedicada às musas, onde se professava um ensino informal através de lições e diálogos entre os mestres e discípulos: uma residência, uma biblioteca e um jardim formavam a escola, tendo esse jardim pertencido a Academus, herói da guerra de Tróia, inspirador do termo academia.
As Academias revestem-se de procedimentos que nos foram legados pela tradição francesa: 40 cadeiras patroneadas por personalidades ligadas às letras e sua difusão, ocupadas por cidadãos no pleno gozo dos seus direitos e que se disponham a seguir essa tradição. A Academia Francesa foi fundada em 1635, por iniciativa de Armand Jean Du Plessis de Richelieu (1585-1642), o cardeal Richelieu, e serviu de modelo à sua similar brasileira.
Na década de 40 do século passado, o Maranhão viveu a fase dos Centros Culturais, que, em muitos casos, conviveram harmoniosamente com as Academias já então existentes, como aconteceu com o Centro Cultural Gonçalves Dias, em São Luís; em Caxias, na mesma época, floresceu o Centro Cultural Coelho Neto, fruto da iniciativa de homens e mulheres militantes culturais, que se reuniam sempre aos domingos, depois da missa na Matriz de N.S. de Conceição e São José, na sala de projeção do Cine Rex, num palco de frente à tela.
Poetas declamavam, um conjunto executava músicas de sucessos, moças representavam e cantavam. Era um momento democrático de verdadeira confraternização; depois, em frente ao cinema, todos vestindo terno branco devidamente engravatados e enfaixados, deixavam-se fotografar à posteridade.
Ao ter escolhido Francisco Sotero dos Reis, Patrono da Cadeira nº 04 da Academia Ludovicense de Letras, prestei uma homenagem póstuma ao meu pai, Antonio Brandão, que o teve também nesta condição, no Centro Cultural Coelho Neto.
Em meados do século XX, ocorreu, no Maranhão, “o fenômeno raro do aparecimento de verdadeiros mestres de Língua Portuguesa Clássica”. Esses mestres estavam seduzidos pela sabedoria gramatical, vinda do século XIX, passada às gerações futuras.
Francisco Sotero dos Reis nasceu, em São Luís, em 22 de abril de 1800, e morreu, também em São Luís, em 10 de março de 1871; “um fato significativo realçando inteligência, capacidade de iniciativa e dedicação aos diversos campos do conhecimento nos quais atuou, a par da história construída à qual agregou imenso valor”.
Foi jornalista, poeta e escritor, e produziu uma obra estritamente vinculada a assuntos filológicos; “suas incursões temáticas sobre a realidade regional também decorreram num contexto de lutas políticas acirradas e instituintes do jovem Estado Nacional e de uma província inicialmente refratária às proposições separatistas do Brasil”.
Suas principais obras foram: Postilas de gramática geral aplicada à língua portuguesa pela análise dos clássicos (1862); Tradução de comentários sobre a Guerra Gálica de Júlio César (1863); Gramática portuguesa (1866); e Curso de literatura portuguesa e brasileira (1866-1868), “mencionando e consagrando as traduções das obras de Virgílio, realizadas por Odorico Mendes, então mais divulgadas no Rio de Janeiro”.
As restrições que Sotero dos Reis fazia ao barroco “era a forma como ele enxergava a sociedade em que ele vivia: escravos vendidos em mercados, o Maranhão agonizando pela queda nos preços internacionais do algodão, fazendo com que os antigos casarões, símbolos da opulência, com suas fachadas ornadas com azulejaria portuguesa de influência árabe, passassem a dividir espaço com uma relva que subia dos telhados com seus mirantes, como uma espécie de jardins suspensos, avistando somente o horizonte ausente de velas ao vento dos barcos que outrora atracavam no porto”.
Salve Francisco Sotero dos Reis, salve!
Antônio Augusto Ribeiro Brandão